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Boteco Connection #14 — Luz, câmera… goró e ação!

Que sofrimento, transmitia aquele casal, lá, naquela mesa. Que lavada, a mulher deu no cara. E ele calado.  Ela puxou o que parecia ser toda a história recente do sujeito. Era um daqueles casos em que ninguém precisava se esforçar para ouvir o que estava sendo sussurrado. Roupa suja pode mesmo cheirar mal à beça. Surgiram nomes. Escorreram detalhes . O cara, calado, só garantia que os copos estivessem sempre abastecidos de cerveja. Parecia que um pedido de isqueiro emprestado aliviaria a tensão. O movimento foi feito por alguém que passava, porque ninguém que estava ali perto teria coragem para tanto. Foram seis de 600ml, em pouco mais de meia hora. A virada veio, depois da sétima. “Fala de amor, fala de sentimentos. Eu fiquei lá… A gente combinou. Eu olhava. Vi um cara alto e voltei. Que susto, ali, naquele momento.”

No bar ao lado, um som alto. E um outro personagem, parecendo protagonizar o trailer de outro episódio de “Histórias desgraçadas”. Só podia ser isso que estavam filmando, mas ninguém via as câmeras. A porcaria de música escolhida, ali, não impedia o “público” de enxergar situações. Diante daquela garrafa de cachaça, que ia e vinha, alguém se debruçava sobre o momento que havia sido feita uma importante troca: em vez de amor em migalhas, amor em goles. A garrafa não ficava na mesa, mas não dava para afirmar que era por isso que os goles eram lentos. Apenas ia e vinha, nas mãos de um garçom que parecia querer cumprir corretamente o protocolo de encher o cálice até a beirada, até derramar/escorrer um pouquinho. Dava para apostar que em pouco tempo o bebedor escorregaria da cadeira. Mas não era um programa de apostas. Era uma minissérie sobre amor-lixo ou algo assim. Não era rodriguiano. Era escroto.

Duas meninas pareciam alheias a tudo. Tinham aparência de muito novas e devem, provavelmente, ter que mostrar os documentos para comprovar que estão na idade de consumir álcool. A pitada de terror da filmagem se deu com estas duas. Foram abordadas por um homem em situação de rua: grande e parrudo, com calça Adidas preta bem justa e uma camiseta verde. O que assustava nele era o tamanho. Parou em frente às meninas e deu para entender que se referiu a uma delas chamando-a de Teresa. Ele levou a mão direita ao próprio peito, quando abordou a duas, como se estivesse se desculpando pelo inconveniente. Teresa estava preparando um cigarro. É, um cigarro desses que a gente enrola com tabaco, pondo um filtro para reduzir danos, e acende fazendo pose de quem não está se matando… Depois do amor em migalhas e do amor em goles, surgiria, então, o amor em baforadas. Ela olhou para aquela com quem dividia a mesa, como que pedindo aprovação, e ofereceu o cigarro ao homem. Ele aceitou. As duas pegaram então suas latinhas, encostaram uma na outra, provavelmente sem conseguir com isso provocar nenhum tim-tim, e saborearam longos goles.

Num terceiro pico, estavam dois homens. Cada um com um celular, porque não dá para imaginar o mesmo aparelho para duas pessoas, né? Com boa vontade, era possível engolir o que os roteiristas queriam empurrar para a galera: o amor em kkkk. Parecia ser o tipo que termina mesmo mais rápido.

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Ghibli: Dez! Nota dez

Fogo. Fogos. Gente correndo. Bichos falando e impondo desafios. Sapos que se empilham e, em segundos, são capazes de encobrir um moleque. Periquitos afiando facas. Questões amorosas escorrendo por todo lado. Portais entre mundos/dimensões diferentes. Momentos de silêncio. Momentos de silêncio? Se não fossem estes instantes em que quase se conseguia ouvir a respiração da pessoa na poltrona ao lado, a gente poderia estar fazendo uma alusão à folia de Momo, que, apesar dos avisos do calendário, ainda se faz presente na cidade. Mas é melhor do que isso: o negócio é a pré-estréia de “O menino e a garça”, filme de Hayao Miyazaki — a.k.a. Studio Ghibli. Lançada no Japão, em julho de 2023,  a animação chega agora a esta parte do globo.

Após um início já muito intenso, é possível pensar que o filme deve estar na prateleira em que ficam coisas para adultos. Tem morte. Tem guerra. Mas tanto o menino Mahito revela-se um homenzinho corajoso, capaz de lidar com questões “de outro mundo”, quanto, no decorrer da fita, a sucessão de “loucuras” garante sorrisos e ruídos de satisfação à plateia mesmo que ela seja bem heterogênea. O filme é uma adaptação de “How do you live?”, história de Genzaburo Yoshino que o Google informa ter sido publicada pela primeira vez em 1937.

Em duas horas e quatro minutos, o público fica assombrado com detalhes que — não há como evitar — trazem à lembrança os maravilhosos “Ponyo: Uma amizade que veio do mar” (2008), “O castelo animado” (2004) e “Meu amigo Totoro” (1988). Numa brincadeira/tentativa de fazer associações com outras histórias, não é difícil comparar sete senhorinhas com os anões da Branca de Neve. Os prazeres visuais, isto é, os lugares aonde Miyazaki pode te levar dependem um pouco, claro, da tua capacidade de associar as imagens que ele apresenta com referências que já existem. A tal da tua bagagem. Mas mesmo os menos iniciados no circuito da realidade fantástica animada podem ficar atônitos com todo aquele surrealismo-pouco-é-bobagem.

Vale investir num ingresso para ter esta experiência numa sala escura com uma tela gigante lá na frente. Enquanto os celulares não destroem também isto. Ao mostrar gente velha, sopas sendo preparadas, animais, lama e personagens construídos com traços de dor, rigidez e nobreza, Miyazaki como que convida a um exercício de mergulho interno e de resistência. E quando parece que vamos ficar no conforto do entendimento, flertar com um happy end bem explicadinho, o que se ganha é um tapa na cara, seguido pelos créditos.

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Codinome Dondoca

Se você é duma geração que teve a sorte de assistir ao “Agente 86”, deve lembrar de quando no seriado Maxwell Smart, aquele do sapatofone, recomendava ao Chefe o uso do Cone do Silêncio. Era um dos melhores momentos dos dois. O ator Don Adams nasceu para aquele papel, o de espião do Controle. O nome da agência deles era Controle. O Chefe, vivido por Edward Platt, ficava doido, quando Max sugeria o Cone para que tratassem de algum assunto sério. Era o protocolo, mas o Chefe sabia que o dispositivo não funcionava bem. Eles gritavam, dentro daquele troço, e não se entendiam. Era como se o Cone do Silêncio fizesse justamente o contrário do que deveria: em vez de proteger uma conversa, fazia com que ela fosse revelada ao mundo. Mais ou menos como um aparelho de celular pode fazer, hoje em dia.

Pode, sim. Olha só. A moça começou falando tranquilamente, mas parecia querer manter livres as mãos. Para poder beber sua água mineral gasosa cara, brincar com o cachorro que a acompanhava, mexer toda hora no cabelo na tentativa de impedir a ação do vento que teimava em deixá-la despenteada… Sabe-se lá. Ela então fez com que o aparelho funcionasse no modo viva-voz. Isso, depois de aparentemente encontrar já, antes, certa dificuldade para ouvir e ser ouvida pela pessoa que estava do outro lado da linha. Antes do modo viva-voz, ela tentou o esquema de encostar/grudar no ouvido a borda menor do retangulozinho mágico. Como se fosse inserir o aparelho na cabeça, através da orelha. Não rolou.

Era cedo, ainda, mas já se podia ver na rua outras pessoas, também com seus cachorros e garrafinhas de água, além, claro, de seus próprios e maravilhosos retangulozinhos mágicos. Se havia ali algum sortudo da Era Maxwell Smart, certamente lembrou do Cone do Silêncio. Como que para manter o clima de agência de espionagem, nasceu naquele momento um codinome: Dondoca. Melhor: Dondoca Smart.

A Dondoca Smart falava quase aos berros, mas mantendo o que se podia chamar de “elegância”. O vento e a garrafinha verde de vidro contribuíam. A missão revelada por ela era ajudar a organizar a festa de aniversário da avó. Soubemos logo em seguida que a coisa toda acontecerá em Brasília, para onde irão primos, primas, tios. Não se falou em cunhados ou cunhadas. Vai ser em outubro. E “vai ter até ministro”. Se alguém da Caos — a agência rival/inimiga do Controle — estivesse ali, teria pescado informações preciosas.

Outra grande questão que se apresentou foi sobre a hospedagem daquela parentada toda. Foi nesse momento que a Dondoca Smart entregou um ponto fraco. Preocupava-se com o conforto das pessoas mais velhas. Pelo menos de uma. Isso ficou claro porque, ao falar do assunto, debruçada sobre o retangulozinho mágico que repousava naquela mesa de concreto, numa praça pública, insistiu com firmeza: “Tem que ver onde a tia Gertrudes vai dormir. Tem que ver onde a tia Gertrudes vai dormir. Tem que ver onde a tia Gertrudes vai dormir.” Alvo fácil para o Caos, quer dizer, a Caos. Uma Dondoca Smart não pode dar aquele “mole” todo.

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@monteiro4852 #152

O vazio.

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O sobrevivente

Nas imortais palavras de Wander Wildner, “Boa sorte, boa morte”. É assim que o sempre-Replicante, atual punk-brega, ícone-ídolo dos corações revoltados de outrora e agora porta-voz de suspirantes-crentes-no-amor terminava “Boa morte”, faixa da sensacional fitinha do grupo Sangue Sujo (da época em que WW era mais “só punk mesmo”). O cassete morreu, mas, por sorte, podemos usar o YouTube para comprovar a existência da máxima. Sorte? Morte? Palavras que, claro, não surgem à toa. Confissões chorosas que podem, sei lá, saltar duma mesa bem ao lado, são capazes de anunciar que o fim está próximo. E no fim das contas — como também diz a letra — “Um dia qualquer no fim das contas você vai morrer”.

Rebobinando ainda mais, e ainda mantendo a atenção ao que vaza da conversa na vizinhança, o escriba revive/constata o drama de Aloisio Dantas, ou Alolô, como zoavam os amigos antes de jogarem pra cima dele o terrível Já-Morreu. Ah, nada como uma reunião de amigos de colégio (suspiro) para conseguir inspiração. Como cresce um garoto, depois de ganhar um apelido assim? Naquela época, não chamavam isso de bullying. Era só sacanagem mesmo. Talvez por isso tenhamos nos transformado num país campeão na formação de psicólogos. O curso atualmente é dos mais procurados, como apontou uma edição da ainda — e surpreendentemente — viva “Folha de S. Paulo”.

Sermos campeões no número de dentistas não fez de nós, ao longo de décadas passadas, uma nação menos boca-suja. Vamos ver o que o pessoal da Psicologia vai conseguir, nas próximas eras. Se serão capazes de ajudar a gente a lidar melhor com a inevitabilidade do Fim. Ou, o que já pode ser um grande adianto, a aproveitar as pequenas mortes. Como no francês, sabe? Pequena morte, sacou? Sacou?

Vestir o paletó de madeira virou assunto banal. Há para isso a contribuição do jornalismo-lixo dos programas televisivos de depois do almoço. A gente diz “jornalismo-lixo” porque o jornalismo mais romântico não sobreviveu para ser/manter-se fã de Wander Wildner. Morreu faz tempo, o pobre coitado. A morte parece hoje tão líquida quanto as relações. Não vão achar absurdo, daqui a um tempo, escolher quem vai morrer através de um aplicativo. Se as pessoas escolhem seus pares passando dedos em telas de telefone, daí para usarem o mesmo método para apontarem quem irá desta para melhor é um pulo. Quer dizer, um clique. No século passado, o Schwarza — eita cara bom de matar gente na grande tela — protagonizou um filme em que um troço mais ou menos assim acontecia num show de TV. Qualquer semelhança com os programas de hoje em dia depois do almoço não é mera coincidência.

É claro que a Inteligêntsia sempre vai poder bater no peito bronzeado e eventualmente bem agasalhado para dizer que a Morte faz parte do jogo. Ah, a Inteligêntsia e seu desprendimento. Ah, a Inteligêntsia e suas referências. Vão dar um jeito de desenterrar “O sétimo selo”. Se bem que vão tirar isso do grande caixão da História mas, apesar de — OK — ser uma grande fita, quem é que vai ter paciência de assistir ao que fez o Bergman, hoje em dia, para depois discutir a respeito? Isso morreu! Nem os psicanalistas fazem mais isso.

Ninguém vai ficar pra semente, como garante a tiazinha do bar, enquanto faz pular as chapinhas dos litrões que os eternos estudantes pediram para a nova rodada de ressurreições. Depois de amanhã, ela diz, com cara séria, “é aniversário de morte da minha irmã”. Um momento de silêncio. E alguém levanta um brinde em homenagem a dona Marli. Beber para jogar Luz no caminho de alguém. Taí. Uma hora alguém ia achar uma coisa boa pra fazer com essa história toda de Morte. Saúde!

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Flerte

Começou com um “Te vi ontem de longe”. A vontade do outro lado era de responder de pronto usando “Ah, se de longe tá bom é melhor ficar assim mesmo…” Mas — angústia-vai-angústia-vem — pintou um “Quer me ver hoje?” e foi tipo no instinto o disparo de um certo “Só se for bem de perto”. A maneira como certas questões se apresentam e se resolvem/dissolvem, é um território em que se pode ainda enxergar originalidade. Sim, dá pra falar em “originalidade”, aí, nesse terreno. Assim como se pode afirmar que é mais fácil falar sobre como elas, as questões, se apresentam, do que sobre as questões-em-si. Este não é um texto para formar samurais. Questões-em-si, na maioria dos casos, seriam boas se ficassem longe. Aplausos para a originalidade, que consegue às vezes entortar as coisas.

Singularidade não anda sozinha. Quando está de mãos dadas co’a sutileza, constrói uma pradaria de beleza ímpar. Uma amplitude danada de bonita, mesmo vista numa telinha de celular. Que é onde todo mundo vê o troço todo, hoje em dia. Né? Quando uma companhia (dona Sutileza, no caso) for capaz de garantir a existência de piadas perigosas, ela mais do que deve ser vivida: deve, isso, sim, ser celebrada. É quase um flerte com a autodeterminação, sem correr o risco de enganar o cara dizendo que crescerá nele um samurai. É do que prescinde o sujeito que vende bilhetes de loteria e pede um refrigerante e uma empada a quem estiver sentado no bar. Bebe o que tem. Come o que tem. Nossa Senhora das Empadinhas nem sempre faz o milagre pelo qual reza o fiel.

Ainda tem gente que vende bilhetes de loteria. Perguntam o ano em que você nasceu e se houver ali uma milhar com aquele número… prepare-se para ser firme no “Não, não quero”. Mas… Do tamanho da fome deveria ser também a retumbância do agradecimento. Como um prêmio na Federal, com bilhete inteiro. Não é porque Nossa Senhora das Empadinhas dessa vez garantiu o frango, no lugar do camarão, que não merece uma… uma missa. Ela, a santa, estava longe ou mostrou-se próxima, quando matou a fome e a sede do mané?

O que acontece é que a gente, a gente que não é samurai e jamais vai ensinar alguém a segurar uma espada, a gente se confunde com os sinais que aparecem. E com as piadas que youtubemente falando se mostram necessárias para uma vida plena de realizações, quer dizer, de seguidores. Aconteceu outro dia com um cara que se viu diante de uma banda que misturava alemão e japonês. Idiomas. Misturava os idiomas, não cidadãos.

Uma banda pode mesmo te apresentar mais problemas do que diversão? Vai saber. Tinha o caso daquela chilena que ficava com o pé atrás com as músicas do Nirvana, porque achava as letras pesadas. Não queria cantar aquelas coisas. Não queria aquelas influências. Não queria. Não queria ficar perto daquilo. E nem mesmo longe sentia-se segura.

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Um, dois: feijão com arroz

Parou ali, no Café Gaúcho, na volta de Niterói, aquela cidade escura, e quando percebeu já estava bebendo um. Conseguiu resistir aos sanduíches, aos rissoles, às empadas. A ilha do cafezinho, que mesmo em tempo de pandemia fica bem movimentada, durante o dia, já estava fechada. Era quase noite. Ou já era noite. Tanto faz, como tanto fez. Se desse alguma merda no estômago, como vinha acontecendo, a culpa seria só do goró. Nada de rissoles. Sempre é mais fácil, assim, quando a gente tem certeza do que ou quem deve condenar.

A questão não era complicada. Era aquela escrotice de quase sempre. Dinheiro, trabalho, compromissos, responsas. Outra condenação certa. Para compensar, havia a mensagem do Lúcio, que merece ser chamado de Mister Prata. Oferecendo ajuda, falando dos perrengues que ele mesmo andava encarando, das cervejas que eram cada vez mais raras. A mensagem do Mister Prata tinha sido a companhia ideal para a travessia de barca. Um percurso que, à noite, de Niterói, aquela cidade escura, para o Rio, aquela cidade que é o que mesmo, hein?, bem, de Niterói pro Rio, a mensagem do cara tinha sido a companhia ideal porque vinha recheada de ideias para um zine. Pra um livro. Pra uma conversa.

Foi uma quase-conversa. E serviu para um entendimento importante: não é só no táxi que é difícil digitar ou jogar xadrez, no celular. Na barca, quando a gente faz o percurso entre a cidade escura e a cidade sobre a qual não se deve falar nada, porque é a cidade da gente, deu pra perceber que mesmo com pouca trepidação é muito difícil se entender coa’quele tecladinho. Assim como é muito fácil errar a jogada no xadrez e fazer besteira numa partida que parecia possível vencer.

Não deu pra resistir por muito tempo. Uma empadinha faria, no máximo, o papel de disputar com a bebida o posto de vilã. E a gente não espera isso de uma empada. Quem quer ser vilã ou vilão? As empadinhas estão sintonizadas com o que rola nas redes sociais, querem só parecer boazinhas pra todo mundo. Conseguem. Para um estômago que já estava mesmo embrulhado, tudo bem, né? Uma segunda tulipa. Uma terceira, junto com o pensamento de que uma bala de hortelã seria necessária para evitar problemas. Problema é aquilo que vem depois de um bafo inesperado/inadequado de cerveja. Quer dizer, quando é só um bafo, tudo bem. O problema é isso na cara de outrem.

Pelo que diz o vídeo de agora, no YouTube, as pessoas na Grécia também têm problemas com bafo de cerveja. Como serão as balas de hortelã de lá? Ou o que será que usam para evitar problemas, naquela parte do planeta? Medo de andar errado, uma preocupação extrema, quase paralisia. Não dá pra caminhar e vr vídeo. Porra, mas três chopes, só, e isso ficou assim desse jeito? Foram mesmo só três chopes? A pergunta se repetia mais do que os anúncios no YT, antes de cada música. Na esquina escura-mas-clara, porque era uma esquina do Rio, ou clara-mas-escura, porque era da cidade que de uma maneira ou de outra sempre acolhe. Mesmo que seja uma acolhida para na sequência conduzir a um quarto em que os spankings de revistas alemãs antigas parecerão fichinha diante do placar marcado no lombo do cordeiro. Sete a um. Dez a zero. Um a zero que seja, porque o que vale é ganhar.

Tem sempre alguém dando palpite na orelha da gente. Quase nunca é uma pessoa equilibrada. A gente suporta porque palpite, geralmente, vem baixinho, disfarçado de conselho. Sempre é necessário ter cuidado com os conselhos que pipocam por aí. Alguém que não tem coragem de agir deveria concentrar-se na própria covardia, apenas, em vez de encher o saco do resto da humanidade. Quatro chopes. Cinco chopes. Foram seis. Seis chopes.

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Quem cringe?

Explicar a moda pode ser mais difícil do que entender a estupidez. Tendência é coisa que um dia, quem sabe, vai parar de ser discutida. Pode nem estar longe, isso, porque continua perigoso ficar em mesa de bar, falando besteira e tentando entender a vida. Daqui a pouco, todo mundo desiste disso, dessa história de “entender”. Seja como for, “cringe” segue sendo a coisa que todos — de influencers a antigos “formadores de opinião” — parecem querer escrever/citar. Aliás, todos, não: todEs, né? Vamos brincar de “respeitar tendência”, já que é pra falar de uma, sempre correndo o risco da acusação de deboche. Quer coisa mais divertida?

Pode ser que com aquilo que chamam de “fim do período de retrogradação de Mercúrio”, que estava anunciado para ontem, não como tendência mas como, sei lá, fato, seja possível “mais comunicação e portanto mais entendimento”. Mas é bom ir com calma. Sem cringe, sem crise. Tipo vai ser tranquilo para lavar a louça do almoço, mas pensar na roupa suja são outros quinhentos. Deixe a roupa suja para depois. Siga a tendência que não põe em risco a tua vida. Tome vacina.

Ah, de repente, dá uma saudade de “Inverno sombrio”, d’Os Replicantes.

Tendência e publicidade se misturam? Ou se sustentam? Uma cria a outra? O que o carioca vai fazer com esse frio todo? O que a gente precisa fazer para frear o Tik Tok, pra eles pararem com aquele anúncio em que colocam uma menina para dançar, no quarto? O André Dahmer já fez tirinha falando de dançarinas de Tik Tok, os mais velhos já lembramos de Carla Perez e do É O Tcham. Já deu. O Tik Tok já pode parar. Alguém precisa parar o Tik Tok.

A menina aparece de shortinho, quase sempre de barriga de fora, às vezes de Mulher-Maravilha. Há sequências em que duas outras pessoas se anunciam, no filminho, como que interrompendo a dança da protagonista. Deve ser uma campanha para uma geração muito específica porque a gente que passou pelo medo da guerra nuclear não consegue fazer outra coisa que não seja se incomodar com aquilo. E odiar o Tik Tok. O Tik Tok é a prova de que publicidade pode funcionar muito bem com um nicho.

Vai ter quem diga que este escriba está frequentando ambientes virtuais “errados”. Nem é o caso. O caso de o escriba parar para ouvir isso. É o caso de os publicitários-marketeiros descolados e criativos e extremamente capazes de produzir com baixo custo segurarem a onda. O que nos resta de neurônio serve para lembrar que houve um momento ali na campanha do Trump em que uma “legião de tik tockers” zoou o republicano fazendo com que um comício fracassasse. Esquerdopatas de plantão aplaudimos. Mas agora chega. Ou… Zooom! Zapp! Punch! Cringe!

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Um feat aqui, outro ali

Nessas brincadeiras de ir até o “passado”, que a internet faz com a gente, apareceram duas coisas “novas”. Dois feats. Löis Lancaster Feat. Negro Leo com “O poder da merda” e BNegão Feat. Paulão King com a releitura de “Cérebros atômicos”.

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Mameluco Canibal

Uma loucura leva à outra. Teve essa história de o Junior Abreu participar daquele single do Zé Sem Nome e logo na sequência ele lançou também uma parada novinha: “Só pro teu dia alegrar”, com o Diego Cruz, com quem forma o Mameluco Canibal. Outra onda.

Nesse caso, é bem mais fácil entender a letra: “sou capaz de tudo até mover o muro / só pro teu dia alegrar / corro riscos, enfrento o mundo / só pro teu dia alegrar / dou nó em pingo d`água / só pro teu dia alegrar / enfeito noites com castelos / pinto de cores todo o resto / só pro teu dia alegrar / finjo paz quando há guerra / acalanto as noites de trevas”.

Dá pra chamar de muitas coisas, isso aí. Clipe feito com o celular. Música de estreia. Guitarras cremosas. Dá até pra correr o risco de dizer que Abreu e Cruz estão lidando com o grande combustível da música pop. Aquele papo de amor, sabe qual é? Em tempos pandêmicos, um ingrediente assim, pros mais ranzinzas, pode parecer ainda mais piegas. Mas a dupla aperta o bom e velho botão do F… “F” de “fazer”, sacou?

Cruz (esq.) e Abreu fazem de tudo pra alegrar o dia de alguém