“Você não sabe do que eles estão falando”, disse ela.
Categoria: Arte
@monteiro4852 #174
Por que você sempre acha que acabou? Eu, veja bem, eu é que deveria achar isso.
O que torna uma pessoa merecedora disso ou daquilo? A gente merece o show de Madonna, aqui no Rio? A pergunta não quer dizer que o escriba a considere grande coisa. E tampouco a última frase serve para colocá-la num lixo liliputiano qualquer. A questão é: aqui está a artista, em pauta/alta. Nos últimos dias, foi esculhambada por um velhaco cineasta lacrador, celebrada por uma colunista bonitona e de veiculozão, passou pelas confissões de uma crítica gastronômica que lamentava que seus amigos chefs não lhe tivessem dado qualquer informação relevante… Madonna estava em todos lugares, nos últimos dias. Até aqui. E parecia unir o que já estava junto, além é claro de apartar o que já estava separado.
Os conselhos, essas coisas que a gente sempre pode ouvir, em vagões às vezes lotados do metrô, pareciam estar sendo dados aos montes e sendo direcionados a quem se arriscaria a ir à praia de Copa para ver a veterana. Será que Madonna fica boladona de ser chamada de “veterana”? Alguém tem para ela um conselho sobre isso? Ah, não era sobre isso, o conselho no vagão entupido de gente? Não, era para quem quisesse ouvir, e era em torno duma regra básica para eventos deste naipe naquele bairro: “levar o celular do ladrão”. Pra quem veio de fora, o encontro com Madonna na praia vai ser uma aula/prova de sobrevivência. Para quem é da cidade, idem.
E pra quem não tem maturidade para absorver ensinamentos assim tão… tão importantes? Tipo a menina de 11 anos, que vai ter que se contentar em ficar na areia mesmo, em meio aos milhões de aconselhados que foram até lá para participar da festa. Precisava ter já chegado aos 13 para participar da promoção que oferecia ingresso VIP para a maratona. O primo do vizinho de um amigo sumido foi quem falou: Madonna publicou no Insta dela que você estará concorrendo a um ingresso VIP se mandar um zap com a palavra “rio”. Tomara que alguém esteja espalhando isso no metrô, porque mesmo que hoje em dia as notícias — as falsas e as muito falsas, principalmente — circulem por celular, artista que já pretendeu orientar o futuro de uma certa humanidade hoje tem uma certa cara de passado e… e é isso que dá pra apontar como legal nela.
Para o cineasta grisalho, parece que nem mesmo isso. Cineasta não aprende mesmo, né? Essa mania de provocar, de achar que dá para fantasiar inveja de verdade… Precisava dizer que aqui no quintal tem pelo menos umas duas dezenas de cantoras melhores do que a material girl? Não deu tempo de pesquisar que intérpretes são estas, porque, além de cheio o metrô anda atrasando muito. Aí, você chega tarde em casa e vai escolher o lado de quem está contra o show em frente ao Copacabana Palace? Não, você vai lá conferir se é verdade essa história de sorteio de ingresso vip porque, cara, se você consegue, vai ser tipo ganhar na loteria. “Menos. Menos. Menos.” Tipo ganhar no bicho, pode ser? Só não vai arrumar confusão comparando Madonna com um bicho qualquer. O conselho vale também para quem não é cineasta. Ela é da espécie das vencedoras. Das que fazem o mais ranzinza dos alvinegros levantar a bunda do sofá pra dizer que sua música preferida é “Borderline” e, também, rascunhar algo. Já que não vai na porcaria do show. Pelo menos faz uma porcaria de texto.
@monteiro4852 #173
Deixa que eu deixo. Enfim… Relaxa, que hoje é sexta.
@monteiro4852 #172
O tempo não existe. Mas está passando.
@monteiro4852 #171
Estavam todos bêbados, ontem.
Fogo. Fogos. Gente correndo. Bichos falando e impondo desafios. Sapos que se empilham e, em segundos, são capazes de encobrir um moleque. Periquitos afiando facas. Questões amorosas escorrendo por todo lado. Portais entre mundos/dimensões diferentes. Momentos de silêncio. Momentos de silêncio? Se não fossem estes instantes em que quase se conseguia ouvir a respiração da pessoa na poltrona ao lado, a gente poderia estar fazendo uma alusão à folia de Momo, que, apesar dos avisos do calendário, ainda se faz presente na cidade. Mas é melhor do que isso: o negócio é a pré-estréia de “O menino e a garça”, filme de Hayao Miyazaki — a.k.a. Studio Ghibli. Lançada no Japão, em julho de 2023, a animação chega agora a esta parte do globo.
Após um início já muito intenso, é possível pensar que o filme deve estar na prateleira em que ficam coisas para adultos. Tem morte. Tem guerra. Mas tanto o menino Mahito revela-se um homenzinho corajoso, capaz de lidar com questões “de outro mundo”, quanto, no decorrer da fita, a sucessão de “loucuras” garante sorrisos e ruídos de satisfação à plateia mesmo que ela seja bem heterogênea. O filme é uma adaptação de “How do you live?”, história de Genzaburo Yoshino que o Google informa ter sido publicada pela primeira vez em 1937.
Em duas horas e quatro minutos, o público fica assombrado com detalhes que — não há como evitar — trazem à lembrança os maravilhosos “Ponyo: Uma amizade que veio do mar” (2008), “O castelo animado” (2004) e “Meu amigo Totoro” (1988). Numa brincadeira/tentativa de fazer associações com outras histórias, não é difícil comparar sete senhorinhas com os anões da Branca de Neve. Os prazeres visuais, isto é, os lugares aonde Miyazaki pode te levar dependem um pouco, claro, da tua capacidade de associar as imagens que ele apresenta com referências que já existem. A tal da tua bagagem. Mas mesmo os menos iniciados no circuito da realidade fantástica animada podem ficar atônitos com todo aquele surrealismo-pouco-é-bobagem.
Vale investir num ingresso para ter esta experiência numa sala escura com uma tela gigante lá na frente. Enquanto os celulares não destroem também isto. Ao mostrar gente velha, sopas sendo preparadas, animais, lama e personagens construídos com traços de dor, rigidez e nobreza, Miyazaki como que convida a um exercício de mergulho interno e de resistência. E quando parece que vamos ficar no conforto do entendimento, flertar com um happy end bem explicadinho, o que se ganha é um tapa na cara, seguido pelos créditos.
Aquele papo de Natal e fim de ano. Festa, festa, festa. Inclui fácil, fácil, uma última aula. Um último chocolate. Peraí, vamos nos resguardar com as aspas: “último”. Em meses como dezembro, a gente tende a não lembrar de começos. Quando despertou o interesse pelo desenho, pelo café, pelo chocolate, pela…? Não. A gente só sente o tempo passando, chances — se é que podemos chamar assim — escapando. Um tantinho de aprendizagem. Num grupo de estudos, o sujeito é capaz de sentir também que algumas “verdades” flertam com o “absoluto”. A hora de parar, por exemplo. De considerar o troço pronto. Serve tanto para texto quando para desenho.
Nem sempre é fácil, ou mesmo possível, decidir isso. Aí, vem o outro lado da moeda. Ou mesmo outra moeda. Alguém sugerindo que se revisite um determinado trabalho, que ali ainda há (n)o que mexer. Qualquer estômago embrulhado, ar de dor de cabeça, desconforto-sem-nome pode surgir daí. A existência de uma hora “certa” para terminar alguma coisa não significa que todo mundo vai concordar com o momento em que essa necessidade surge.
Você está preparado para uma sentença/sugestão como “Vamos refinar as coisas, hoje… Nesse antigo mesmo… Em vez de começar um novo…”?
Para o que você se preparou? Está tudo OK para participar da foto da turma, com iluminação dirigida por alguém que se preocupa com luzes e sombras? Está relax para deixar os cliques acontecerem? Será capa de sorrir? Numa sala repleta de artistas e observadores natos, o que ficará evidente na pose da turma? Os que os sorrisos dirão? O que a luz dirá? O que as sombras dirão? Apertos de mão fortes. Sorrisos repetidos e ao mesmo tempo ímpares. Abraços. A lembrança de um desenho que representa uma vitória, ou, ao menos, um passo dado.
Ah, as sombras. Fim de ano é dia de lembrar de frases marcantes. Tipo “Core shadow é onde a sombra canta”. É dia de rir com piadas toscas: “A pessoa se mexe porque é aula de modelo vivo… Se não mexesse, seria modelo morto…” É tempo de esperar que as informações se assentem, que deixas ganhem corpo, que vibes circulem. Que chocolates estejam sempre presentes. É dia de no caminho procurar novos sentidos para o que está rabiscado ali nos velhos sobrados da Gamboa: “Vento / Vem me trazer / Boas novas”.
A gente não pode ficar vivendo de lembranças de comédias românticas. Ainda mais quando elas têm duas décadas de lançamento e deixam claro que envelhecem num ritmo diferente do nosso. Nós, os eternos personagens. Os filmes, sejam de que estilo for, parecem sempre ter alguma vantagem em relação a isso que chamam de vida real. A gente, na busca por uma “saída”, talvez possa viver de aniversários em bares. Porque se as mesas e calçadas desses lugares são capazes às vezes de servirem de palco para — em vez de filmes — verdadeiras novelas mexicanas, esta programação, em datas comemorativas, periga virar tipo um capítulo especial. A quem não gosta de um frisson acima da média?
Outro dia na Marlene foi assim. O aniversariante, pra começar, viu acontecerem encontros que não estavam na programação. A data de nascimento é mesmo um bom dia para concluir de vez que não é possível controlar tudo. Uma desconhecida comentou que ao falar com uma amiga tinha ouvido, desta, que ia a um aniversário na São Salvador. “Ah, aniversário, só pode ser na Marlene.” E era mesmo. Junte um bar e uma data comemorativa e você terá não um filme, não uma novela mexicana roots mas, quem sabe, um seriado.
Professores de desenho fazendo sucesso entre um pessoal que talvez não consiga rabiscar nem um boneco-palito. Quer dizer, podem haver surpresas agradáveis, em encontros imprevistos. Aniversário em bar não é uma faca de dois gumes. É um exercício de digestão. Como digerir um encontro inesperado? Como suportar um desencontro? E um segundo desencontro, numa mesma noite, sendo que é uma noite de capítulo especial? Cenas marcadas, bem marcadas. Cartas marcadas. Mensagens na parede do banheiro. Marcas do tempo, um tempo que é de outro estilo; diferente do das comédias românticas. Sem chegar a ser filme de terror, porque cachaça e cerveja deixam todo mundo alegre.
Repetecos. Com novos personagens. Casais brigando, baixinho, porque é aniversário, demonstrando consideração com o comando da festa. Pessoas que estiveram naquele mesmo pico, um ano antes, sem serem convidadas, e numa coincidência cinematográfica ou musical, reaparecem para… para sumirem, logo em seguida, deixando o comando da festa atordoado. Além de entender que não dá para controlar tudo, aniversário é bom para sacar que não existe coincidência. Complicado? Quem sabe no ano que vem você entende.
As manobras que a gente precisa fazer às vezes para não apertar a mão de alguém, né? Mesmo que às vezes nem haja nesta escolha tanta certeza. O cara pode ficar perdido entre aqueles dois caminhos: um que a placa descreve como certa a opção de tocar outrem. Um segundo, uma outra placa, ali, bem do lado, que avisa sobre o risco do que será absorvido mesmo que o toque seja acidental. É muita coisa para a gente decidir, o tempo todo.
O que faz uma pessoa colar um adesivo num banheiro público? O que faz alguém remover de um banheiro um sticker que estava lá, muito de bobeira mas com o compromisso, talvez, de animar mijões e mijonas das mais diversas origens. É mais fácil a gente perdoar quem coloca ou quem tira? Perdoar é fácil? O que é o perdão? Gente que cola pedaços de papel ou plástico por aí não deve estar preocupada com o perdão de ninguém. É intrigante tentar achar motivos que fazem alguém colar um troço numa caixa de metal que fica bem no alto de um poste. Mijões e mijonas não devem se divertir com aquilo porque fica muito no alto.
A falta que pode fazer, veja só, não só um adesivo mas, também, o contato com o pessoal que te vende aquele café especial. Um pacote se esvaziando pode ser o gatilho para alguém pensar na relação que se forma, depois de alguns anos, entre duas pessoas, mesmo que os encontros se limitem a dar-o-dinheiro-pegar-o-pó. Às vezes, dá para subverter o protocolo. Como quando a entregadora, em pé num balcão de bar onde marcou o encontro com o cliente, fala sobre uma cerveja escura que está vendo na geladeira e que a faz lembrar-se de uma irmã mais velha. Um rolé que começa com uma promessa de pó de café pode render uma cerveja, uma descoberta, uma história de família. Sem esquecer de olhar a porcaria do Instagram, que ninguém é de ferro.
Um aviso que chega muito em cima da hora, no laço, e por isso — mais do que matar uma vontade — faz a gente querer ainda mais alguma coisa. Uma ampulheta em que a areia escorre tão rapidamente que o observador pode chegar a visualizar, na parte inferior, uma espécie de aspirador de pó. Não de pó de café. De pó rosado, que é a cor da areia que passa pela cabeça no escriba, no momento em que a frase é montada. Areia cor-de-rosa, ampulheta com duração de seis minutos. Meia dúzia de minutos. Meia dúzia de frustrações, de encontros que não se confirmam. Porque o tempo é curto. De quanto tempo a gente precisa para tomar um café? Quando você fala “Vamos tomar um café?”, está pensando em quanto tempo?
O moleque pede água. Não se bebe adesivo. Ainda. Do lado de dentro do balcão, o atendente do bar finge não perceber a mão que estava esticada, buscando um aperto, uma saudação. Ao menos, rolou a água. Uma sede chegou ao fim. Para bom amarelador, meio sorriso amarelo basta. Para bom corredor, meio café basta. Para quem está atrasado, meia corrida não resolve. Para quem entende a mão e não recebe uma mão de volta, um copo d’água pode virar um balde de água fria. Em dias de chuva, a água fica ainda mais gelada. Em cada curva, um adesivo que a gente não esperava.