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Senhor Perigo, Dona Paranoia e companhia

Esta onda de reabertura oficial-e-escandalosa dos botecos, como se durante as últimas semanas muitos não tivessem desrespeitado completamente o “isolamento”, serviu para matarmos saudades que sentimos de certos personagens. O primeiro deles, antes que você reclame da irresponsabilidade desta crônica, é o Perigo. Vamos chamá-lo de Senhor Perigo, em sinal de respeito. Ele sempre esteve aí, ainda mais nestes últimos meses, mas quando de repente disseram “Pode abrir o bagulho todo, mas fechem o bagulho todo às 23h que tá tudo mais ou menos bem”, foi como se o Senhor Perigo estivesse distante e só esperando… E assim ele recebeu um convite para que voltasse a conviver oficialmente conosco. E fazer das suas. Deu um sorrisinho e aceitou, claro. Como se não tivesse sido recentemente uma das companhias mais constantes, ao lado de Dona Paranoia, Seu Vá Pro Inferno e Prima Angústia.

Claro, gente menos famosa apareceu para a festa. Era festa, afinal. Gente sem nome. Bêbado, não precisa de nome. De sobrenome, talvez. O Bêbado Sensível, por exemplo, que fica magoado quando tem que engolir junto com o 12-anos-cowboy uma amiga ladrando, a uma certa distância, talvez, que ele não passa de um “cachorro velho”. Isso provoca um estrago no coração de qualquer bicho que tenha o corpo de fato coberto por pelos brancos. A reabertura trouxe volta tristezinhas particulares assim nestes moldes. Mas aí são fatos isolados. Só mesmo para temperar a crônica. O que nos interessa são personagens famosos. É disso que vivem escriba e leitor. O Poder Público, nem se fala…

A reabertura dos bares trouxe de volta também Uma Certa Verdade. Ela estava solta, soltinha por aí. Houve quem tentasse apropriar-se dela para esfregá-la na cara de outrem. Mas Uma Certa Verdade manteve(-se) (n)a linha, arrumou a máscara e continuou desfilando sem dar bola para manipuladores de plantão. Ainda não houve quem conseguisse alcançá-la.

E, claro… Em nome da civilidade (solte agora aquela gargalhada debochada), ainda não é hora de esfregar nada na cara de ninguém. Isso seria um atentado contra as Regras de Ouro. Regras do Outro, não; Regras de Ouro mesmo, que foi como a Prefeitura da Cidade Pentecostosa do Ria Aí de Janeiro a Janeiro (pra não chorar) chamou o conjunto de normas a serem seguidas pelos estabelecimentos para que pudessem reabrir sem colocar em risco a população. Se Uma Certa Verdade estivesse em dias mais gloriosos, se pudesse atuar com cem por cento de sua capacidade de esfregação, faria o Poder Público entender que o grande risco na verdade é ele.

Quem também resolveu dar as caras foi o Beijo Na Boca. Afinal, do que adianta ir para o Lebronx, encher os cornos e voltar para casa no zero-a-zero? Vomitar, apenas, não tem graça. Antes disso, é preciso ensaiar ao menos uma bitoquinha naquela mina, naquele mano que acredita na liberdade. Por mais que, para alegrar a noite da tradicional família cariokkk, as manchetes televisivas tenham se concentrado no distanciamento responsável que não existiu… o Beijo Na Boca merecia destaque porque foi outro personagem muito visto por aí. Sem máscara, claro, porque nesse caso não tem como ser de outro jeito. Beijo e proteção, assim como chupão e comedimento, nunca foram duplas vistas de mãos dadas por aí. Imagine agora.

No bafafá, apontaram os holofotes para aquele caso do cliente que entrou sem máscara no restaurante e, abordado pelo gerente, disparou (palavra mais adequada, impossível): “Meu presidente liberou…” Houve bate-boca, entre as partes. No caso do Beijo Na Boca, não precisava discussão política alguma, porque ambos os lábios quando partem para a ação já estão de acordo em tudo. Nestes dias de Novo Normal, havia no ar um cheirinho de Velho Normal, como era de se esperar, mas aí é outro papo.

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@monteiro4852 #4

Boa terça-feira também pra você. Ó o Alberto Monteiro aí, ó.

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A noite

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@monteiro4852 #3

Alberto Monteiro. Terça-feira é dia de Alberto Monteiro.

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Sabe a Bruna?

Janela perto da rua, em época assim de isolamento, é uma beleza. Você pode ficar fechado e sentindo a vibe da calçada. Tem o cara que varre alguma área bem cedinho. Tem o porteiro do prédio em frente e suas teorias sobre… ah, só bobagem. Tem a dona do cachorro, com voz de quem tem mais de 80, verdadeira especialista em reclamar de alguém que se chama Bruna. É fácil você de ouvinte transformar-se em “cúmplice”. Três manhãs seguidas ouvindo a mesma ladainha e dá até para se perguntar: será que ela está falando mesmo pelo celular ou está querendo ser ouvida, sabe que está sendo ouvida? Quatro manhãs ouvindo que Bruna “é mó muquirana, não sabe reconhecer o que fazem por ela” e já dá pra concordar que se trata de uma grande vacilona.

Às vezes, abrir a janela se apresenta como uma alternativa. Mas fica só nisso, numa possibilidade. Isolamento é isolamento. Alguém tem que respeitar. E vai que o cálculo é mal feito e a inimiga, quer dizer, conhecida da Bruna ainda está ali, esperando o cachorro fazer número dois, porque o bicho pode ser daqueles que demoram, e você dá de cara com ela. O que esperar de uma breve troca de olhares? Será uma conexão carregada de cumplicidade? Ou de desconfiança? A dona vai perceber que você está ali há dias acompanhando aquele desenrolo? Com quem será que ela tanto fala sobre a Bruna? E, hm, como será a Bruna, fisicamente, hein?

Assim, perto de onde passam os carros, fica possível também rever uns episódios do passado das nossas vidas. Nunca há silêncio. Nem à noite. É sempre uma avalabche de informações. Pode-se perceber as construções daquilo que, nas próximas pandemias, daqui a uns 30, 40 anos, será o passado da molecada de hoje: o carro que passa oferecendo “ovos fresquinho”, o outro que promete recolher qualquer tralha de metal que esteja ocupando desnecessariamente espaço em casa: ar-condicionado, máquina de lavar, sucata de alumínio… O vendedor de pamonha deve ter sido contaminado pelo vírus. Que se recupere logo. Será que esse pessoal passa na rua da Bruna?

Os barulhos das campainhas ganham outra dimensão, quando você está em casa, concentrado em alguma tarefa muito importante para fazer o tempo passar, na esperança de afastar a preocupação com o dinheiro que está acabando. O porteiro-eletrônico, que se mistura com os de carne-e-osso de antigamente, e a vizinhança mais silenciosa são capazes de fazer a gente se perguntar: o que essa pessoa do 203 aí de frente tanto compra online, hein? E a Bruna, será que tem cascalho para gastar assim de bobeira, nestes tempos bicudos?

Este grande espetáculo oferecido a quem está disposto a prestar um pouco de atenção aos ruídos que preenchem esse mundão de meu Deus servem também de pulga. Pulga atrás da orelha. Se você está ouvindo geral, geral também está te ouvindo. Cuidado com os sons que produz. Defenda-se da fofoca old-school, aquela que mesmo em tempos de isolamento pode surgir numa calçada, numa fila de banco; é capaz de vir nas conversas telefônicas de alguém sem nome mas com língua afiada, conversando pelo celular, cedinho, em frente a uma jalena silenciosa. Viu, Bruna?

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@monteiro4852 #1

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@monteiro4852

Alberto Monteiro é um dos grandes zineiros da geração que ficou conhecida como “Maudita”, com “u” mesmo. É do mesmo naipe de bambas como Fabio Zimbres, MZK, Lauro Roberto, Jaca. Produz loucamente, ainda mais agora, que largou o emprego que tinha para dedicar-se ao que mais gosta de fazer: desenhar e pintar. Já foi representado por uma grande galeria de SP. Já foi fã número um de Sonic Youth. Já foi viciado num rodízio de massas que funcionava no centro do Rio. Vive meio “isolado” (aquele papo de artista, né?), hoje em dia, em Santa Cruz da Serra, de onde sai com a camisa do Botafogo para um ou outro churrasco na casa de amigos. Já topou ser entrevistado, aqui para esta página, mas mesmo antes de isso acontecer começa a atuar como colaborador regular. Vai ser um desenho por semana, provavelmente recheado por sua muito particular maneira de escrever. Isso, até que decida voltar a andar de bicicleta, percorrendo longas distâncias — outra de suas paixões. A coluna vai ser batizada de “@monteiro4852”, sua conta de Instagram.

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Floral

Não anotou, deu mole, perdeu o verso

Num espere que volte, que meia hora já é muito

Perdeu, perdeu, playboy,

Fosse mais esperto

.

Coração que é bom, é coração bom

Coração bom, é coração batendo

Mas é tanto tum, no coração

Que quase não entendo

.

Conflito, é a última coisa que vai ter

Competição, angústia…

Outra aposta, podia não custar nada

Mas custa

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Polegar-pra-cima ou coraçãozinho?

Tem essa coisa do setor cultural precisando de amparo. Mas… Dois tipos de “espetáculo” que sempre estiveram firmes e em alta na internet seguem pipocando durante a pandemia e não parecem necessitar de sequer um tostão para continuar em cartaz. Primeiro, os playbas piadistas, que fazem graça com assuntos sérios: nem se dão ao trabalho de escrever seus próprios “ha-ha-has” e aguardam incansáveis uma nova oportunidade para serem desagradáveis. De outro lado, os sofredores, pobres-desamparados que se abrem para o público, compartilham seus fracassos e fantasmas, jogam luz sobre uma “grande dor” pela qual parecem ser consumidos.

Mundinho de extremos. Nele, os primeiros querem aplausos e um emprego de roteirista. Os segundos, carinho e atenção. Mas se você clicar no coraçãozinho ou no polegar-pra-cima, já vão ficar muito satisfeitos. Porque a internet, afinal, é um mundo de oportunidades e o quintal de grandes empreendedores. Gente movida a joinha. Então, um clique a mais pode sempre ser a migalha que falta para o “artista” diligente fazer o seu próprio sonho-americano virar realidade.

Às vezes, falta ao showman alguma originalidade. A rede mundial de computadores é um poço sem fundo. É cheia de lixo, mas exigente. Uma gracinha é sugada para o web-inferno em questão de segundos. Google é tipo um Saturno: faz tudo envelhecer. Precisa o humorista ter preparo físico, isto é, muita disposição para renovar as bobagens que digita. Na era do “E daí?”, o engraçadinho que cita um exemplo qualquer de área em crise e improvisa a musiquinha-dancinha dos caixões está sendo muito… muito… sem-gracinha.

É mais fácil ter paciência com a galera da tristeza? É? Às vezes, parece que sim. O que pode nos levar para aquele lugar dos bonitinhos ordinários, da solidariedade que mostra a cara somente na hora do câncer. Os dois fenômenos só podem existir porque há público. Para ambos, a única resposta parece ser um polegar-pra-cima. A gente precisa tomar algum cuidado para que, com o tempo, esta não passe a ser também para nós a única possibilidade de resposta.

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Tum!

Sabe o surdo? Tem aquele abatimentozinho provocado pela cuíca, mas é o surdo que pode definir os contornos de uma tristeza mais absoluta, um desespero sem saída, uma saudade aparentemente sem cura. É o surdo, ou — surpresa! — a falta dele, que faz o cara parar e pensar. Surdo é parada, é intervalo, é um mergulho num hiato muito breve que pode te afogar pela eternidade.

Os carnavais acabam. Conforme-se. Há quem defenda agora que não devíamos ter tido a folia do início deste ano. Agora é tarde. Porque ela já aconteceu. Se fizesse sentido falar no que não deveria ter acontecido, gente, o mundo seria ainda mais confuso do que este que você está testemunhando aí, ó. Se fosse para brincar de túnel do tempo, não é o carnaval deste ano que este escriba tiraria do mapa. É “mapa” que se fala, quando a referência tem a ver com a linha do tempo? Calendário?

Sempre existirão as questões que lhe são caras e que, pra outrem, não passam de cagadas. Maturidade, ou “a fina arte de aprender a tocar o surdo”, pode ser o estágio em que você aprende a não relativizar isso. E a não se preocupar. Porque relativizar é o de menos, ainda mais na hora em que você pensa que pode estar no caminho da morte.

Pizza e surdo combinam. Porque a base superior do instrumento — bem ali onde se bate — pode servir de bandeja. Nesse sentido, combinaria com qualquer alimento. Mas é que pizza é aquela coisa da qual a gente pode pegar uma fatia com as mãos (bem lavadas, claro) mesmo e comer sem muita cerimônia. Ainda mais se o comilão for um ianque. Está para nascer gente tão despreocupada com a maneira de comer pizza. E isso não é um ponto contra eles.

Em Botafogo, anos atrás, um casal discutia sobre a divisão de uma pizza. Não era bem uma discussão, mas, sim, um cara sendo acusado de comer uma última fatia sem autorização. Entre os intervalos na ladainha da acusação, quase dava para sacar as batidas de um surdo. Pizzas mal divididas podem dar em fins de namoros. Mas são as batidas de surdo que tornam dolorosas fins e despedidas — mesmo as que vêm de surpresa. Ou que não foram anunciadas. O surdo sempre está lá. Tum…!